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quarta-feira, 5 de novembro de 2014

De volta ao passado#16 - O começo, duma grande e longa caminhada

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Sábado 10 de agosto 2013

Depois de comer, (eu estava cheia de fome!), medicação tomada, tudo feito direitinho, o meu amor veio ter comigo, para voltar-mos a neonatal.
Nesse entretanto, ele contou-me que os nossos pais, são os únicos familiares que podem visita-los, uma visita de 10mn. não mais, mas era melhor que nada e eu bem sabia que estavam todos em pulgas para poder conhecer o netos.
Por isso, ele já tinha combinado com eles a hora e tudo para eles poderem visita-los.
Estou tão orgulhosa do meu marido, ele estava a tomar conta de nós, a sua família!

Chegamos, vestimos a bata (não é nada fácil, sobretudo quando ainda se está numa cadeiras de rodas, parecem ser feitas duma lã imensamente fina ou que é aquilo e é impressionante o calor que elas oferecem), lavamos e desinfectamos as mãos e entramos novamente no mundo dos seres muito pequeninos, onde a nossa vida deu uma volta de 360º.

Mal entramos, ja ouvia-mos o som do alarme do monitor, é claro que havia mais bebés na unidade, mas eu sabia..., sabia que era a minha Princesa e não me enganei, mais uma vez um "enxame" de enfermeiros a volta dela, ela chorava a pleno pulmões, mal a conseguia ver, no meio de tanta bata verde, o meu Príncipe, ele, estava a dormir, sereno, sem qualquer apito ou alarme.
Pergunto mais uma vez, peço mais uma vez que nos digam o que se está a passar e todos dizem que é NORMAL, para não nos preocupar.... Vou para junto dela, continuava a chorar copiosamente, tão pequenina, uma miniatura de gente, mas com uma força descomunal para mostrar o quanto está insatisfeita. Mesmo no meio de tubos, adesivos e mais adesivos, ela consegue mexer-se, é impressionante a força de vontade que ela tem, devagar, aproximo-me do ouvido, peço-lhe para ela ter calma, mimo a mão dela com o dedo, e mesmo assim tenho medo de a magoar, ela agarra-me o dedo, sim, ela tem força para isso e a pouco e pouco ela acalma, os alarmes ficam mudos, os enfermeiros respiram de alivio.
O meu mais que tudo está ao pé do nosso filho, mas olha atentamente par os monitores dum e doutro e da mesma forma faço o mesmo e comparo.
Mesmo não percebendo nada de nada de medicina e afins, havia de conseguir decifrar qualquer coisa.
Vejo que existe 3 gráficos, um verde, um branco e uma azul, cada um tinha um número, que deduzo ser uma percentagem.
O primeiro, o verde, é fácil, é o ritmo cardíaco, o branco e o azul não consigo perceber o que é, ainda!
O que salta a vista é que os valores da Princesa são sempre mais baixos que o do mano, calculo que os alarmes voltam a fazer-se ouvir a partir dum certo patamar, portanto deduzo, que haja valores de referencia, um alto, um baixo e que quando baixa ou ultrapassa esses valores fica a vermelho e todos se põem em alvoroço.

O tempo passou a correr, o que sei, o que sinto, é assustador, os alarme, mesmo ela quietinha a dormir voltavam e voltam a apitar..., a resposta era sempre a mesma, NORMAL!
Com toda esta movimentação de enfermeiros, médicos, ela sentia-se incomodada e chorava, chorava, nós assistia-mos sem poder fazer nada, éramos impotentes, algo estava acontecer, mas nada diziam.
Chegou a hora combinada dos avós poderem conhecer os netos, não nos sentíamos à vontade, os alarme soavam e soavam, até perguntamos, se era mesmo seguros eles subirem, se não era melhor esperar que ela estivesse melhor, sei que fui rude a falar, porque já não aguentava ver tanta indiferença, por nos dar informações, algo concreto.
Mais uma vez, as mesma respostas, não há problema, é normal, eles que venham.

Saímos..., desanimados, não era necessário falar, os nossos olhares compreendiam-se, ao caminhar pelo corredor, um corredor direito, um corredor comprido demais, estávamos a combinar, ele iria acompanha-los até aqui, enquanto eu ficava aqui a espera, o som dos alarmes fazia-se ouvir..., lágrimas caírem..., ele segurava-me a mão, de repente sai duma sala a pediatra de serviço, a mesmo pediatra que foi rude comigo, um dia antes de ser mãe, a mesma pediatra que viu os meus filhos nascer.

- Estava a vossa procura!

- Vamos trazer os nossos pais cá a cima, todos dizem que não há problema!

- Pois, mas não vai ser possível, decidimos, transferir a vossa filha para Coimbra, para o hospital Pediátrico  e a ambulância já está a caminho.

Estava sentada na cadeiras de rodas, mas senti-me cair, tonta, queria articular qualquer coisa, mas não conseguia, senti as mãos do meu Homem a agarrar as pegas da cadeiras de rodas com demasiada força, só consegui articular,

- Mas porquê? Não é tudo normal? Ainda agora, ia-mos trazer os nossos pais para vê-los!

A senhora Médica Pediatra, com a maior atrevimento que vi até hoje, responde:

-Porquê? Vocês não querem que ela seja transferida?

(Alguém, pode explicar-me, onde estes profissionais de saúde, tem a sua humanidade, humildade e empatia para com o desespero dos pais dos seus doentes??????)

-Claro que queremos que ela vá, se é para o bem dela!!
- Então, preparem-se, que a ambulância pode chegar a qualquer momento.

Ficamos os dois no corredor, já disse que era comprido demais?!
Ele foi avisar os nossos pais daquilo que nem nós sabíamos o que estava a acontecer, voltou, choramos, agarrados choramos, não conseguia pensar em nada, só ouvia os alarmes a tocar, as batas verdes a correrem, por vezes nem era preciso correrem pois mal o silencio se impunha, mal viravam costas e la estava o barulho ensurdecedor, o barulho que estava a despedaçar o meu coração aos pouco, porque nem forças tinha para poder mimar o meu Príncipe.

A equipa da ambulância chega, uma médica, uma enfermeira e a condutora da ambulância. Entram com uma incubadora, cheia de artilharia, pequena, pequena demais penso eu, sinto-me claustrofóbica só de pensar em como vão levar o meu tesouro dentro daquela "caixa".
Os profissionais de saúde falem entre eles, apercebo-me que primeiro a "Saturação" está sempre muito abaixo dos níveis, mesmo estando ela a receber oxigénio (SATURAÇÃO????? O QUE É ISSO???), assim sendo eliminaram a hipótese de ser algo a ver com os pulmões, ouço:
- Deve ser cardíaco então?! Quais os exames e analises que foram feitas?
Chega um enfermeiro com um dossier, que achei demasiado cheio, vejo cabeças a acenar, eu e o meu marido num canto, como que a olhar para um quadro em movimento, abraçados, a chorar.
Sinto que ele não quer, queria poder dizer-me que estava tudo bem, que tudo era normal, mas ambos sabíamos que não há palavras para aquilo que o quadro estava a pintar.
Deixei de conseguir ouvir ou distinguir o que estavam a dizer, só sei que agarram a minha miniatura de gente, a minha Pigente, com um cuidado tão grande, ela chorava, como sempre a ouvi até agora, um choro de quem reclama, de quem está insatisfeita, de quem tem uma força que pode mover montanhas.
Coloquem a Princesa na "caixa" sustive a minha respiração, a enfermeira de Coimbra, olha para mim, vê a minha reacção, explica-nos que a "caixa" é uma incubadora como as outras, com mais artilharia, mas era isto que iria manter em segurança a nossa menina durante o caminho até Coimbra. Acenei para ela, chegamos-se ao pé da "caixa", despedi-me da minha menina, disse-lhe um até já et un JE T'AIME TRÈS FORT, para ela ser forte e persistente, que logo iria visita-la, que o pai, ele, ia já já atrás dela e um beijo meu voou até ela.

Deram as indicações ao meu Homem, estavam a sair da unidade, vejo a condutora da ambulância, uma moça que deveria ser pouco mais nova do que eu, empurrava a "caixa" onde estava a minha Pigente, ela chorava, estava com os olhos e a cara vermelha e a cheia de lágrimas, ela estava a compartilhar a nossa dor.

Um ultimo aceno, pelo o corredor fora....

JÁ VOS DISSE QUE O CORREDOR É DEMASIADO COMPRIDO?!



*Ainda hoje, gostaria de saber quem era a moça da ambulância, não sei dizer porquê, nem sei o que lhe diria, mas ela tocou-me, ver que afinal, ainda existe pessoas com empatia, com coração.
Obrigado a ti, mesmo não sabendo quem és.


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